Surf, filosofia Zen, Keanu Reeves e Patrick Swayze. Algumas das razões para o sucesso de Caçadores de Emoção (1991).
Quando Point Break foi lançado, os críticos foram rápidos em descartá-lo como machista e superficial. O impulso de Caçadores de Emoção de Kathryn Bigelow, pode ser resumido em dois pontos: corpos e desejo. Nas mãos de Bigelow, uma história potencialmente convencional se torna um filme subversivo.
Johnny Utah (Keanu Reeves), O quarterback que se tornou agente do FBI, busca pela adrenalina do combate ao crime; como o surfista Bodhi (Patrick Swayze) que anseia pela adrenalina que vem com o risco.
Para financiar um verão sem fim, Bodhi e sua equipe de surfistas formam uma gangue de assaltantes de banco. Disfarçados como os ex-presidentes dos EUA e cometendo roubos perfeitos e quase indetectáveis, em revolta contra um “sistema que mata o espírito humano”, nas palvras de Bodhi.
Seguindo o palpite de seu parceiro mais experiente, o agente Pappas (Gary Busey), Johnny se infiltra na cena do surf de Los Angeles. Lá, se vê intoxicado pelo estilo de vida eufórico dos surfistas, pego na onda de sua anarquia iluminada.
Lori Petty interpreta Tyler, o interesse amoroso de Johnny é o ponto de acesso à subcultura, ela é maravilhosamente dura contra a infantilidade de Reeves. No entanto, o calor de seu romance é superado pelo próprio relacionamento de Johnny com Bodhi, à medida que o vínculo fácil dos homens se transforma em fixação.
O divertido é que existe essa colisão. Se Pappas (Gary Busey), o parceiro, é aquele que encoraja Utah a cavar cada vez mais fundo, Tyler (Lori Petty) funciona como a voz da razão, sempre advertindo sobre as consequências de contemplar um sentimento tão poderoso. A representação da beleza é o perigo.
Tem uma cena em que Utah é confrontado com a seguinte afirmação: “O surf é uma fonte. Pode mudar a sua vida”. Na verdade o início de uma jornada. O momento de decisão, mesmo que de forma inconsciente.
Durante uma entrevista que Swayze deu no lançamento do filme, expressou admiração pelo fato de a dinâmica entre Johnny e Bodhi não ser uma “porcaria idiota, machista e brincalhona”. “Eu queria jogar como uma história de amor entre dois homens”, disse ele. Esta é a leitura mais rica de sua dinâmica: dois adversários, perfeitamente combinados de alguma forma cosmicamente íntima.
Enquanto alguns filmes de assalto estão interessados na mecânica de cometer um crime, Caçadores de Emoção está preocupado apenas em trazer Johnny e Bodhi para as órbitas um do outro. Eles são, no sentido mais simples, estimulados simultaneamente.
Suas lealdades opostas necessariamente os colocam como presas um do outro, e essa paixão destrutiva carrega sua dinâmica enquanto os impede de cometer danos reais. “Você me quer tanto que é como ácido em sua boca”, provoca Bodhi.
Há algo elétrico em como os limites entre “certo” e “errado” são tão sensacionalistas que chegam a ser dramáticos. Claro, Johnny é um apêndice de autoridade perseguindo o modelo ideial da ilegalidade, mas a dinâmica tradicional herói/vilão também é transgredida por seu parentesco natural.
Como Tyler observa desde o início, a dupla compartilha um certo “olhar kamikaze”. Eles são motivados por coisas semelhantes, perseguindo os mesmos sentimentos, só que um canaliza seus desejos por vias legalmente sancionadas enquanto o outro o procura em outro lugar.
É verdade que Reeves às vezes é afetado em sua performance, mas mesmo isso funciona de alguma forma – Johnny está se esforçando para seguir o protocolo do FBI, enquanto tudo em seu corpo anseia por um prazer maior.
Há algo cativantemente desconfortável na maneira como o personagem se senta em sua própria pele. O que esperamos de um jogo de gato e rato, em que o gato ainda não percebeu que ele também é um rato?
Swayze felizmente equilibra Reeves com uma presença tremendamente fundamentada, nivelando os impulsos mais teatrais de sua co-estrela. É uma performance incrivelmente centrada, aprimorada pela fisicalidade controlada de Swayze, em torno da qual Johnny de repente faz mais sentido: ele está ansioso por algo, e seu rival possui exatamente o que precisa para ser libertado.
Toda essa filosofia Zen vem acompanhada de tomadas incríveis, além de uma trilha sonora envolvente. Todos os elementos foram entregues na dose certa. Não é o típico filme de ação. Existe uma divisão muito eficiente.
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Resumindo. A trama é basicamente sobre a libertação de Utah. Os acontecimentos levam ao personagem ao limite, ao ponto aonde se torna impossível resistir a liberdade. Um caminho sem volta.
O lançamento foi em 1991, mas continua atual. Perfeito em cada sentido, existe uma profundidade, não vou simplesmente falar que é superior as produções atuais, mas existe uma identidade e energia única. Esqueça as comparações, entenda como algo único e necessário para qualquer fã de cinema e um dos melhores da carreira de Keanu Reeves e Swayze. Assista!
Fonte: The Guardian, IMDB